O corpo esta presente, mas a mente navega em outro plano, numa dimensão onde a vida é simples e a brisa é sempre fresca. Uma lágrima solitária rola pelo rosto enquanto a ponta do lápis machuca o papel. Quando ela finalmente percorre todo o rosto e cai na folha de papel, o pensamento até então contido invade a sala como uma ventania. A inspiração chega e arrepia a nuca, o coração batia acelerado e as mãos trabalhavam com afeto enquanto a mente tentava não lembrar. O rosto de João nascia naquele papel vindo de uma lembrança fresca, os lábios dela diziam "João" com a delicadeza de um peito que machuca por saudade.
Ela pensava e até conseguia ouvir a voz dele dizer "Ca-ta-ri-na", "Catarina", como se realmente ele estivesse olhando pra ela com aqueles olhos sempre afetuosos, como se aqueles lábios quase finos pudessem sorrir de volta, pudessem confortar o corpo e tranquilizar a alma.Ele veio consolar uma dor que ele mesmo causou, veio confortar um coração e segurar o orgulho que impedia as lagrimas de serem livres.
João, João. Simples e bobo.
A voz dele parecia invadir o corpo dela, esse corpo que era cheio de orgulhos e medos.
"Catarina. Linda. Minha, mesmo que só na vontade."
O desenho ficou pronto. João sério mas com olhos risonhos, exatamente como fazia quando estava prestes a dizer "Catarina" com a devoção.
As lagrimas nasciam em seus olhos num gesto de total desrespeito ao orgulho. Cah chorou sentada, pressionando a ponta do lápis contra o folha de papel até ela quebrar. Acendeu um cigarro e levantou, enquanto João a via partir mais uma vez.